"Os povos indígenas não estão agricultando vossas terras, mas pra que isso não aconteça alguém está ganhando alguma coisa" – Deputado Zé Trovão
Na segunda-feira, dia cinco de junho, ocorreu uma audiência pública na Comissão do Meio Ambiente e Desenvolvimento sustentável (CMAD) com o tema “Agricultura, Meio Ambiente e autonomia indígena”.
O deputado Zé Trovão (PL/SC) coordenou essa discussão e começou dizendo "Todos os indígenas, vocês sabem muito bem disso, tem morrido de fome todos o dias no Brasil. Pessoas que não são assistidas muito menos pelas ONGS e não podem usar suas terras pra fomentar suas próprias riquezas”, levantando o debate sobre a efetividade das ONGS, além dos empecilhos enfrentados pelos povos originários para usufruir da própria terra.
Inclusive muitos desses assuntos também foram abordados na “A Voz das Etnias”, onde representantes de 27 etnias estiveram presentes relatando suas vivências e debatendo soluções e parcerias. Alinhada com essa proposta, a Deputada Amália Barros (PL/MT) ressalta “A gente não pode admitir que o povo indígena fique refém de ongs e de pessoas não indígenas dizendo o que é ou não bom pra eles, é muito importante esse momento de dar voz a vocês”
É de suma importância, pontuar que o Ecossistema Dakila iniciou essa conversação com os povos originários, criando “A voz das etnias” em março desse ano. O quadro tem intuito de propagar a voz das comunidades indígenas sem intervenção das mídias, além de criar parcerias benéficas para ambos os lados.
Seguindo o raciocínio o representando da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Alcebias Constantino, reflete sobre o que se consideram como desenvolvimento e o quanto esse tal desenvolvimento vale a pena. “O que que é desenvolvimento mesmo para nós, para as comunidades indígenas? É o que 3, 4, 5 máquinas plantando, enquanto lá embaixo tem outro meu parente morrendo contaminado com veneno? Esse desenvolvimento? É isso que nós queremos de fato para o desenvolvimento brasileiro? Onde uma classe maior se beneficia e a outra se prejudica."
É importante entender, assim como fez o deputado Zé Trovão, que as terras indígenas são atualmente uma concessão da união, o que impede que eles sejam de fato donos da terra e seus recursos, contrariando a própria Constituição Federal que diz:
”§ 2º - As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.” (Capítulo VIII, artigo 231)
Grande parte da audiência se voltou a discutir soluções para tal usufruto e desmistificar a rixa entre os povos originários e o agronegócio. Inclusive muitos dos indígenas presentes levantaram o agro como sendo a base da vida, o caminho certo para a autonomia indígena e como legado de sua ancestralidade, sendo que já plantavam muito antes dos colonizadores chegarem a essas terras.
Além disso, a embaixadora dos povos indígenas, Patira da etnia Sucuru, trouxe ao plenário a desunião dos povos originários, tendo em vista as peculiaridades de cada comunidade e etnia. Arnaldo Zuninakae, presidente da Coopihanama e Ronaldo Zokezomaiake da etnia Pareci assentem trazendo também as diferenças de região e bioma que influenciam diretamente nos projetos de agricultura.
Embora existam essas diferenças, é certo que toda pessoa indígena quer trabalhar, ter sua autonomia e viver com dignidade.
“Chega de nos chamar de pedintes, chega de nos chamar de preguiçosos. Queremos o direito de trabalhar. E que me mostre uma lei que nos impeça. Que me mostre que a agricultura não é vida a algum ser humano nessa Terra” – Luciene Kayabi, assistente jurídica da Agroindígena.
A embaixadora ainda demonstrou sentimento de impotência quando, apesar de seu cargo, relatou a existência de uma verba de 22 bilhões de reais que está travada por conta de burocracias. Esse valor somado com as arrecadações de ONGs e outras instituições deveria ser mais do que o suficiente, relembrando que existem cerca de 16mil ONGs somente na região da Amazônia, ainda assim não se vê esses recursos chegando nas comunidades indígenas.
Solicitando uma prestação de contas a liderança Guajajara, José Marcos diz "Esses recursos internacionais que são captados pelas ONGs, eu queria que um deles me respondesse e me mostrasse a prestação de conta. Onde é que tá sendo investido esses recursos das ONGs, enquanto isso os parentes estão vivendo na pobreza, na miséria da comunidade"
Durante a audiência também levantaram aspectos como a formação e capacitação de indígenas; a regulamentação de projetos de agricultura como forma de segurança e responsabilidade; estruturação de um ministério da agricultura indígena e alguns pontos de vista da PL 490, conhecida como Marco Temporal.
Lucineide Kayabi ainda chamou atenção do plenário “Que cultura é essa de que nossa plantação irá destruir a nossa floresta. Somos conscientes, inteligentes, sábios. Sabe por que somos assim? Porque somos ancestrais, há 12mil anos plantamos diante esse planeta chamado Terra e agricultura nunca matou, agricultura deu vida”, citando ainda o Messias Faustino Santana “Nós fazemos parte do Agro”
Audiência completa:
Resumo da audiência:
Capítulo VIII da Constituição Federal – artigo 231 e 232:
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